Casa de acolhimento começou como creche para PCDs e hoje mantém 106 crianças e adultos moradores constantes

“Se os pais abandonaram, será nós temos o direito de fazer isso também? Não temos!”, disse a diretora de assistência social da instituição

redacao 03/02/2024 16:00 • Inspiração

O sonho da socióloga Maria Cristina Cordeiro Caldas gerou frutos: o Lar Vida nasceu em 1985, a partir da preocupação da soteropolitana com as famílias com crianças portadoras de deficiência, que viviam em vulnerabilidade social na cidade. Cristina desejava abrir uma creche com cuidados especiais, para que os pais pudessem deixar os seus filhos durante o dia, enquanto trabalhavam.

O primeiro desafio foi conseguir convencer o seu marido, Guilherme da Silva Caldas, a se juntar a ela nessa missão, mas como tudo que ela colocava na cabeça, se tornou realidade. “Uma pessoa do coração enorme, que nunca conheci igual”, afirmou Reinaldo Cardoso, gerente administrativo da instituição.

O propósito inicial da casa estava sendo cumprindo, até que alguns pais passaram a deixar os seus filhos e não mais buscar. Foi então que a socióloga entendeu que aquela não era mais uma creche, mas um lar de acolhimento. O casal envelheceu e partiu cumprindo o seu propósito, mas a instituição segue crescendo e, atualmente, é conveniada com a Prefeitura de Salvador.

“A primeira sede foi na alameda da praia, de Stella Maris. Só que algumas crianças começaram a ficar, pois os pais não podiam buscar, não tinham tempo, condição… as primeiras a ficar foram três crianças surdas e mudas que o juizado ofereceu a ela através de um convênio. Ela ficou com essas três e hoje já são 106 com essa unidade maior”, explicou Reinaldo.

Principais demandas

O valor recebido pelo Lar através do convênio não cobre as despesas locais. Das 106 crianças e adultos acolhidos, apenas as 40 crianças são cobertas pelo poder público. Os que completam 18 anos ficam de fora do auxílio já que, oficialmente, o Lar Vida é conveniado apenas para receber menores de idade PCDs em vulnerabilidade.

“Só podemos receber crianças e adolescentes, mas eles ficam o resto da vida. Uma grande dificuldade da gente é que, a partir dos 18, a gente não tem mais esse convênio. Eles passam dos 18 e ficam sob responsabilidade da instituição e do Ministério Público […] Essa criança já está vulnerável e já passou por muita coisa. Vamos virar as costas para eles? Somos a família deles e família não faz isso”, disse o administrador.

Como o espaço acolhe pessoas com necessidades especiais, uma das principais demandas do Lar Vida é conseguir manter o pagamento de funcionários capacitados. Essa é a maior preocupação de Sônia Argolo, diretora de assistência social da instituição.

“Nós temos um corpo e empregados com cerca de 80 funcionários, fora as diaristas, as acompanhantes de hospital, para quando um menino precisa ficar internado. Isso tudo demanda custo e nós não temos grandes fontes de renda. Nós temos um convênio com a Sempre [Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer], que contempla 40 crianças e adolescentes, e o nosso objetivo, para nós podermos respirar melhor, é conveniar os adultos. Quem era criança ou adolescente aqui se tornou adulto. Quem vai nos ajudar? Par aonde vão esses adultos que estão aqui na instituição? Se os pais abandonaram, será nós temos o direito de fazer isso também? Não temos! A gente tem nossos amores, nossas afetividades”, desabafou Sônia.

Reinaldo Cardoso endossou a aflição da assistente social e detalhou como essa mão de obra específica e constante é necessária. “Coordenador, fisioterapeutas, enfermeiras, técnicos de enfermagem, cuidadores auxiliares, cozinheiras, nutricionistas… a gente precisa de um atendimento qualificado e técnico 24 horas, de domingo a domingo. Na enfermaria temos crianças com sonda, crianças que precisam ter o batimento cardíaco monitorado 24 horas… então é preciso um corpo técnico operacional muito eficaz e competente”, detalhou.