ARTIGO: Transparência na Bahia
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU, Resolução 217A (III), de 10 de dezembro de 1948, em seu art. 21, garante a toda pessoa o direito de tomar parte na direção dos negócios públicos do seu país. Em perfeita sintonia com esse direito universal, […]
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU, Resolução 217A (III), de 10 de dezembro de 1948, em seu art. 21, garante a toda pessoa o direito de tomar parte na direção dos negócios públicos do seu país.
Em perfeita sintonia com esse direito universal, a Carta Magna brasileira de 1988, no título dos Direitos e Garantias Fundamentais, art. 5º, XXXIII, assegura a todo brasileiro e aos estrangeiros residentes no País o direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei.
A Carta Maior brasileira, art. 34, VII, d, considera o ato de prestar contas um princípio constitucional. A sua não observância é motivo até para intervenção federal, a saber: “Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: […] VII – assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: […] d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.”
Igual regra vale também em relação aos municípios: “Art. 35. O Estado não intervirá em seus Municípios, nem a União nos Municípios localizados em Território Federal, exceto quando: […] II – não forem prestadas contas devidas, na forma da lei.”
As contas estão sujeitas, nos termos do Art. 71 da Constituição, a controle externo, a cargo do Congresso Nacional, que será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas.
O prestar contas é essência da accountability, aqui entendida como o dever de todo administrador de responder por um compromisso assumido. Isso quer dizer que ela representa a obrigação ética e legal que tem todo administrador público de prestar as contas dos dinheiros da coletividade de forma transparente.
Quem bem retratou essa prática foi Simón Bolívar, ao afirmar: “A Fazenda Nacional não é de quem vos governa. Todos aqueles a que haveis tornado depositários de vossos interesses têm a obrigação de demonstrar-vos o uso que deles tenham feito”.
Mas não basta tão somente apresentar as contas no prazo da lei. Necessário se faz que esse prestar contas seja tempestivo e transparente. E a transparência não pode aqui ser entendida tão somente no seu sentido mais usual, como atributo do que é transparente, ou seja, daquilo que permite ser visto. Em termos de administração pública, a transparência determina que o prestar contas seja feito de modo claro, correto, abrangente, honesto, sincero, tempestivo.
Ao meu sentir, a transparência, princípio implícito na Constituição Federal materializado no atributo da publicidade, estampado no caput do art. 37 da Carta Maior, deve ser ainda mais valorizada nos tempos da Covid-19. Chego a afirmar que, em relação a contas públicas, transparência acima de tudo, transparência acima de todos. Afinal, não se pode falar em controle, seja em qualquer uma de suas espécies (externo, interno e social), se não houver transparência. Até porque publicidade e transparência são obrigações do Estado, que deve fornecer tempestivamente informações necessárias à sociedade.
Torna-se oportuno aqui rememorar fragmentos da decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), quando determinou monocraticamente, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 690, que o Ministério da Saúde restabelecesse, na integralidade, a divulgação diária dos dados epidemiológicos sobre a pandemia da Covid-19: “A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988, consagrou expressamente o princípio da publicidade como um dos vetores imprescindíveis à Administração Pública, conferindo-lhe absoluta prioridade na gestão administrativa e garantindo pleno acesso às informações a toda a Sociedade.”
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) trata especificamente da transparência ao estabelecer no seu Art. 48 que: “São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.”
Recentemente, a Transparência Internacional Brasil ofereceu à sociedade ranking de transparência geral nos estados e capitais brasileiros no combate à Covid-19. Segundo essa avaliação, o Estado da Bahia situou-se na 17ª posição entre 27 estados, com uma nota de 54.4, em uma escala que vai de 0 a 100. Já o Espírito Santo conseguiu nota de 97.4.
No que se refere especificamente à Covid-19, após avaliação dos portais de 26 governos estaduais, do Distrito Federal e de 26 capitais sobre o modo como informam acerca das contratações emergenciais de forma fácil e ágil, o Transparência Internacional Brasil (disponível aqui. Acesso em: 31 jul. 2020) chegou à conclusão de que, em uma escala de 0 a 100, onde quanto maior a nota, maior a transparência, Espírito Santo, Ceará e Rondônia foram os melhores avaliados com nota 100. Por outro lado, Bahia (82,2) ocupa a 19ª posição ficando, entre os estados nordestinos, na frente apenas do Piauí (69,6), Paraíba (65,6) e Sergipe (65,8). Roraima (40,5) ocupa a última posição.
Conforme dados publicados pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia (disponível aqui. Acesso em: 12 jul. 2020), a avaliação individual das cidades baianas também não é muito animadora. Dos 417 municípios baianos, apenas 16 prefeituras, ou seja, 4% do total, têm cumprido plenamente o dever de informar sobre os gastos realizados contra a pandemia da Covid-19. Isto significa que os gestores de 96% dos municípios baianos não estão permitindo adequadamente aos cidadãos o controle e a fiscalização sobre os recursos públicos que estão sendo empregados nas ações de controle da disseminação da doença, não cumprindo os requisitos mínimos exigidos pela Lei de Acesso à Informação (LAI) e pela Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas de enfrentamento da emergência na saúde pública.
A pergunta que carece de resposta é saber qual o segredo do Espírito Santo, estado que há muito tem dado um bom exemplo no que tange à questão da transparência pública. Ao se analisar a qualidade das prestações de contas, das propostas de leis, tanto orçamentárias como das diretrizes orçamentárias, ao se examinar o Portal da Transparência dos gastos públicos no estado do Espírito Santo, tem-se um bom norte.
E uma outra questão que nos provoca é: se o Espírito Santo fez, por que não há de baixar um santo espírito aqui na Bahia para que saiamos dessa incômoda posição regular?
Torna-se importante rememorar que o estado da Bahia foi pioneiro no que se refere ao processamento eletrônico das informações contábeis para a administração pública. De fato, nos idos dos anos oitentas, a Bahia inaugurou o Sistema de Contabilidade para administração pública, denominado de CE, que serviu de base, inclusive, para o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi Federal). Esse sistema baiano evoluiu para o Sistema de Informações Financeiras e Contábeis (SICOFI).
Atualmente o estado possui uma boa ferramenta de registro e acompanhamento dos recursos públicos, que é o Sistema Integrado de Planejamento, Contabilidade e Finanças (Fiplan). Além disso, também dispõe do Sistema Mirante, ferramenta que o Tribunal de Contas do Estado da Bahia oferece e que possibilita um rápido e transparente acesso às contas públicas.
Assim, não é chegada a hora de o sistema Mirante encontrar-se disponível de forma ampla na rede mundial? Assim como nas praças públicas, nos shoppings, quando abrirem, obviamente, na rodoviária, no aeroporto, ou seja, onde haja um totem em que qualquer cidadão possa colocar o dedo e fazer a pergunta: o que é está sendo feito com meu dinheiro?
Afinal, como bem pontuou o procurador Roberto Livianu, no artigo “A inadmissível escuridão do poder”, publicado no jornal Folha de S. Paulo, de 2/06/2020: “A sociedade, na democracia republicana, tem direito à informação com transparência plena e a instituições absolutamente fortes, vigorosas e independentes, que possam funcionar imunes a interferências, nos termos da Constituição.”
*Inaldo da Paixão Santos Araújo
Mestre em Contabilidade. Conselheiro-corregedor do Tribunal de Contas do Estado da Bahia, professor, escritor.
inaldo_paixao@hotmail.com
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