Abuso de álcool na adolescência: psicóloga aborda causas e resultados dessa prática
A psicóloga Miriã Lima apontou que o consumo de álcool tem se iniciado cada vez mais cedo e explicou os danos gerados por essa prática
No último dia 18 de fevereiro, foi celebrado o Dia Nacional de Combate ao Alcoolismo, uma doença crônica e multifatorial, que é um dos mais comuns transtornos mentais. A campanha tem como objetivo conscientizar a população, como um todo, sobre os danos causados pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas, contudo, um grupo específico tem chamado a atenção no quesito de consumo dessas substâncias: os mais jovens.
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a venda de bebidas alcoólicas é proibida para menores de 18 anos. Além disso, oferecer esse tipo de produto para esse grupo também é proibido. Mesmo assim, estudos apontam um aumento no consumo de álcool por parte dos adolescentes e até mesmo de pré-adolescentes, que têm ingressado nesse universo cada vez mais cedo. Grande parte dessa iniciação, inclusive, acontece dentro de casa, com o aval dos responsáveis já que, culturalmente, o álcool é desassociado do conceito de droga, mesmo se tratando de uma.
Segundo a psicóloga Miriã Lima, especialista em Saúde Mental e Substâncias Psicoativas, especialista em Geståo de Pessoas, formada em Terapia de Família e casal e Mestra em Psicologia da Saúde, o álcool faz parte da história da humanidade, sempre se fazendo presente na rotina das famílias, dessa forma, se torna mais fácil desassociá-lo de uma droga, que ainda é um tabu para muitas sociedades.
“Quando se fala em droga ainda tem muito tabu envolvido, tem muito preconceito, é um tema que as famílias evitam até permitir que esse termo faça parte das rodas de conversa e isso acaba fortalecendo essa distinção álcool e droga”, disse ao Portal M!, destacando também que, por se tratar de uma droga lícita, o álcool possui mais aceitação social que outras substâncias que alteram o sistema nevoso central.
“Existe um tabu, tanto que é comum a gente usar a expressão ‘álcool e outras drogas’, mas quando a gente entende o que é droga, compreende que é tudo aquilo que altera o funcionamento do nosso sistema nervoso central”, explicou Miriã Lima, que também é professora do Centro Universitário UniFG.
Outro fator de aceitação social para o consumo do álcool são as músicas com letras que ressaltam os “benefícios da bebedeira”, além do mercado publicitário, que se utiliza de elementos atrativos para associá-los a esse tipo de substância. “O mundo da música e da publicidade é muito presente e faz parte da vida dos jovens e, muitas vezes, a publicidade é apresentada de uma forma atrativa, isso acaba influenciando. Influenciadores digitais acabam postando, por exemplo, que faz uso de álcool… isso pode sim contribuir para que esses jovens reproduzam esses comportamentos”, pontuou a psicóloga.
Consumo entre os brasileiros
De acordo com o último relatório publicado pela Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde, com dados coletados de dezembro de 2022 a abril de 2023, houve um aumento do consumo abusivo de álcool. A população geral teve um aumento de 18,4% para 20,8% entre 2021 e 2023. Entre pessoas do sexo masculino, este aumento foi de 25% para 27,3% no período, e entre pessoas do sexo feminino este aumento foi de 12,7% para 15,2%. Quando se comparam os anos de 2010 e 2023, é possível perceber que houve um aumento significativo do consumo abusivo entre as mulheres, enquanto que, entre os homens, houve uma estabilidade.
Sobre o consumo entre o público mais jovem, a última Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta que esse consumo tem acontecido cada vez mais cedo no Brasil. Segundo o levantamento, 63,3% dos estudantes entre 13 e 17 anos já experimentaram alguma bebida alcoólica. Além disso, 47% dos alunos nessa faixa etária afirmaram que já ficaram embriagados pelo menos uma vez.
Essa adesão à essa substância, segundo Miriã Lima, pode ser perigosa, pois são muitos os efeitos nocivos do álcool ao organismo, seja à curto ou longo prazo. Quando se tratam de pessoas menores de idade, a questão é ainda mais complexa.
“No primeiro momento, o álcool tanto vai gerar o comprometimento na saúde física da pessoa, quanto comprometimento nos aspectos psíquicos e sociais. O cérebro do adolescente ainda está em desenvolvimento, então, quanto mais cedo a pessoa passa a fazer uso do álcool, existe um risco do comprometimento do desenvolvimento desse adolescente. Comprometimento cognitivo e das funções psíquicas, como por exemplo, a memória e a percepção. A longo prazo, outras doenças podem ser desenvolvidas: doenças cardiovasculares, doenças hepáticas… reflexos de um consumo abusivo e crônico”, explicou a especialista.
Miriã Lima afirmou também que um dos fatores que se relacionam como o alcoolismo é a questão hereditária, genética e o contexto social. “A gente faz uma investigação para compreender esse padrão geracional. Entender quem é, na história familiar, que já apresentou esse problema com o uso de álcool. Se eu tenho um pai, um avô ou toda uma família que desenvolveu o uso crônico de álcool, eu tenho mais chances de desenvolver o alcoolismo do que alguém que não tem esse histórico”.
Alcoolismo Crônico e os sinais de consumo exagerado
Segundo a Pesquisa Álcool e a Saúde dos Brasileiros: Panorama 2023, produzida pelo Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), 45% dos brasileiros ingerem bebida alcoólica em festas, eventos sociais e até mesmo em casa. Ainda segundo o estudo, boa parte dos brasileiros abusam de álcool, mas não percebem seu padrão de consumo como problemático. Os dados demonstram que 27% dos brasileiros têm consumo moderado de álcool e 17% abusivos, mas 75% dos consumidores abusivos acreditam que são consumidores moderados.
Dessa forma, como identificar que o consumo de álcool já pode ser considerado abusivo? A psicóloga Miriã Lima citou o DFM5 – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o que chamou de “bíblia da psiquiatria”, para destacar alguns sintomas indicam a dependência do álcool.
“Primeiro a pessoa precisa cada vez mais de doses maiores de álcool. Se a necessidade e a quantidade forem progressivamente maiores, acaba sendo um sintoma de dependência. Outro sintoma é a abstinência. Se a pessoa manifesta uma síndrome de abstinência, nós podemos também considerar um sinal de dependência. E outro sinal é a necessidade do consumo diário. A pessoa não consegue manter a sua rotina normal sem o álcool, ela já acorda, já começa o seu dia, com a necessidade de consumir álcool”, detalhou.
Outro alerta destacado pela especialista é a incapacidade ou a dificuldade de se divertir e de socializar sem a “ajuda” do álcool. “Um dos motivos que levam as pessoas a fazerem o uso do álcool é justamente para ter habilidades sociais. A pessoa acha que, para se comunicar, para se relacionar, ela precisa do álcool. No caso do adolescente, a gente precisa ajudar a desenvolver essas habilidades sociais sem precisar recorrer ao álcool. Se você faz uso de álcool todas as vezes que vivenciar uma situação social, por exemplo, você pode achar que a única estratégia existente é depender do álcool. O caminho dessa pessoa é buscar entender que existem outros caminhos”, aconselhou.
Para a Classificação Internacional de Doenças (CID-10), os sinais evidentes do consumo exagerado de álcool são: desejo forte ou senso de compulsão para consumir a substância; dificuldade em controlar o comportamento de consumir o álcool; estado de abstinência diante da falta da substância; aumento de doses; evidência de tolerância; abandono progressivo de prazeres alternativos em favor do uso do álcool; persistência do uso mesmo diante de prejuízos vivenciados tanto na saúde, como nas relações familiares e no trabalho.
O que pode ser feito?
De uma forma geral, a psicóloga Miriã Lima indicou, como forma de frear o consumo excessivo de álcool, pensar em estratégias de prevenção, entendendo os mecanismos que levam a essa forma de ingestão da droga. No caso dos adolescentes, os pais precisam ficar atentos e participarem ativamente das discussões de questões emocionais com os filhos.
“É muito comum que o adolescente busque o álcool por necessidade de aprovação, do sentimento de pertencer a um grupo de amigos, a necessidade de se sentir aceito, como uma forma de lidar com a ansiedade, de lidar com o sofrimento etc. […] Existem algumas comorbidades relacionadas ao uso do álcool: a depressão, a ansiedade, o déficit de atenção e hiperatividade… os pais precisam estar atentos aos sinais que começam a aparecer quando os seus filhos começam a fazer uso do álcool. O comportamento fica mais agressivo, alteração no rendimento escolar etc.”.
A especialista ressaltou que a venda e o fornecimento de bebida alcoólica para menores de idade é crime e, portanto, as famílias precisam se responsabilizar não apenas pela fiscalização do consumo prematuro, como para encerrar a prática perigosa de fornecer essas substâncias às suas crianças e adolescentes.
Para Miriã Lima, essa observação dos responsáveis também deve incluir outros fatores. “Avaliam as amizades com que esse adolescente está envolvido, o ambiente em que ele está e promovam atividades socioculturais. A espiritualidade também é um recurso muito utilizado atualmente para o tratamento de álcool e droga. Tudo isso deve ser associado ao tratamento da psicologia, da psiquiatria e do tratamento psicossocial”, indicou.
O adolescente, como destacou a psicóloga, possui mais dificuldade que o adulto em fazer uso do álcool de forma adequada, equilibrada e consciente. Por isso, quanto mais cedo ele usa e vai perdendo o controle, o risco de uma dependência torna-se muito maior também na vida adulta.
“No primeiro momento os pais precisam ir pelo caminho do diálogo, tentar identificar qual é o sentido, a relação que esse adolescente está buscando com o álcool. Caso os pais percebam que o uso já está comprometido, trazendo prejuízos para essa criança, esse adolescente, peçam ajuda profissional. Hoje nós temos, enquanto política pública, alguns lugares que oferecem o acompanhamento psíquico para pessoas que apresentam um consumo abusivo. Existem também a Unidade de Saúde da Família, que serve de porta de entrada para a saúde mental e pode oferecer esse cuidado inicial à essas famílias. Existe a terapia familiar e também atendimento individual, em alguns casos. A depender do comprometimento da saúde desse jovem, ele também pode precisar de acompanhamento psicológico”, disse ao Portal M!.
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