ARTIGO: Moraes Moreira é pombo correio da MPB em voo imortal*

Pensei em não escrever sobre o desenlace do grande artista Moraes Moreira, que desencarnou na madrugada de segunda-feira (13). Falei desse meu posicionamento em conversa pela manhã com os amigos Anibal Gondim e José de Jesus Barreto. Mas durante o almoço, uma voz me disse: “Vá, escreva, mostre aos leitores o que eles devem também […]


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Glaucia Farias 14/04/2020 15:10 Artigos

Pensei em não escrever sobre o desenlace do grande artista Moraes Moreira, que desencarnou na madrugada de segunda-feira (13). Falei desse meu posicionamento em conversa pela manhã com os amigos Anibal Gondim e José de Jesus Barreto. Mas durante o almoço, uma voz me disse: “Vá, escreva, mostre aos leitores o que eles devem também saber de Moraes”.

Pois, pois. Estou aqui diante do computador fazendo um catado de lembranças que escorrem em minha mente para mostrar que Moraes Moreira foi e continuará sendo um dos grandes nomes da Música Popular Brasileira (MPB). A morte não finda a sua arte!

A primeira notícia sobre a morte de Moraes, dormindo, foi dada pelo amigo museólogo Anibal, que é de Ituaçu, onde o artista nasceu e tem familiares. A notícia chegou ao Grupo GIP em Ação, que tem ainda o amigo e artista plástico Miguel Cordeiro, criador do lendário Faustino.
Anibal, às 10h18, disse no grupo: “Corre a notícia em Ituaçu que Moraes Moreira faleceu dormindo. Ataque cardíaco. Mas carece de verificação. Só a família está sabendo”.

Fiquei meio tonto com a notícia e não quis acreditar. Torci para ser um boato. Mandei zap para Paulinho Boca de Cantor para saber se era verdade. Depois ele confirmou em áudio dos mais emotivos: “Estou ainda em processo de recuperação emocional para falar. Conversava sempre com Moraes, três ou quatro vezes ao dia, para falar de coisas boas da vida. Estávamos cuidando dos Novos Baianos como nunca!”.

Também sem acreditar, o amigo jornalista José de Jesus Barreto mandou várias interrogações diante da minha pergunta se era verdade o que estava sendo falado em Ituaçu. 
As horas passaram rápido e chegou a triste confirmação, já no final da manhã. De imediato, lembrei dos carnavais na Praça Municipal, no tempo de “Pombo Correio” e do frevo trieletrizado com sotaque baiano apimentado pelo artista, com mais molejo, com ijexá, numa época onde havia mais arte e menos grana.

O amigo artista cantante de forró Bery Campos também lembrou dessa época, “como se aquele tempo fosse hoje, num piscar de olhos”. E o que dizer deste grande artista que nos deixou como um feixe de luz ao passar por uma fresta da janela em clarão da manhã?

Como pesquisador da música baiana, a partir da dissertação “A Trajetória de Vida de Luiz Caldas: Ascensão, Inflexão e Retomada”, conferi que Moraes foi e é muito mais do que um dos líderes do grupo Novos Baianos. Ele sempre foi um poeta-popular-urbano que faltava na MPB, pois tinha a alma interiorana que sabia unir com sabedoria letra e melodia, sem ser careta.

João Gilberto ensinou-lhe, sem precisar dar muitas aulas, que a essência musical estava dentro do Brasil e nos acordes precisos. Assim, curtindo uma legal, Moraes redescobriu que a sua musicalidade estava no próprio sangue, no Brasil pandeiro. 

Mas não é só isso. Digo ainda com base nos meus estudos que Moraes não inventou a Axé Music por um triz, tudo porque naquele momento de sua carreira solo, no fim dos anos de 1970 e começo dos anos de 1980, ele estava lutando no Rio de Janeiro, depois de deixar os Novos Baianos.

A ida para a Cidade Maravilhosa causou um hiato de Moraes com a cultura local de Salvador. Nesse momento, emergia a Axé Music na obra de Luiz Caldas, que aglutinou em alquimia própria as diversas canções tocadas pelas bandas de baile no interior da Bahia.

E com relação às suas canções. O que podemos dizer? São tantas pérolas que não cabem na minha memória. Dos discos “Lá vem o Brasil descendo a ladeira” e “Bazar Brasileiro” destaco: “Lá vem o Brasil descendo a ladeira” (com Pepeu Gomes), “Chão da Praça” (com Fausto Nilo), “Pelas capitais” (com Jorge Mautner), “Assim pintou Moçambique” (com Antonio Risério), “Meninas do Brasil” (com Fausto Nilo), “Grito de Guerra” (com Toni e Risério) “Forró do ABC” (com Patinhas), “Que papo é esse?” (com Capinan e Fausto Nilo), “Pessoal do alô (com Risério) e “Lenda do pégaso” (com o multiartista Jorge Mautner). 

Na fase dos Novos Baianos, no começo de tudo, afirmo que a canção “Preta Pretinha”, em parceria com o poeta Luiz Galvão, tem lugar cativo na minha discoteca das 100 melhores canções da MPB.
Mas nem tudo foi céu de brigadeiro na carreira de sucesso de Moraes. Ele sofreu, e muito, a perseguição de gente graúda para não tocar no Carnaval de Salvador. Desculpe lembrar desse fato caro leitor neste momento de dor, mas foi uma grande maldade, tudo para beneficiar uma patota que emergia no dentro do Carnaval e no dorso da grana da Axé Music.

Quem quiser saber mais sobre este afastamento basta fazer uma rápida pesquisa na internet, onde estão os nomes dos seus algozes. Mas Moraes superou tudo isso pela força de seu talento e com apoio de gestores pernambucanos. Que ironia! A Bahia tem essa coisa mesquinha de atrapalhar a vida de grandes artistas com tramas de bastidores. É lamentável!

Moraes Moreira nos deixou num voo de pombo correio. Ele foi mandar um recado para Deus, falando de nós, nas suas canções imortais. Obrigado por nos alegrar com tantas coisas boas, eternas e verdadeiras. 

*César Rasec é jornalista, doutor em Letras, escritor e pesquisador musical

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